Vera Gers Dimitrov, advogada do CDHIC, orienta trabalhadoras domésticas sobre nova Lei de Migração no marco do projeto Mulheres Migrantes Trabalhadoras Domésticas
No último domingo, 26, o Sindicato dos Trabalhadores Domésticos do Município de São Paulo (STDMSP) escolheu uma mulher imigrante para representar a luta das trabalhadoras domésticas imigrantes e refugiadas junto à direção do sindicato. Diana Soliz de García, 56, boliviana, nunca havia participado de uma associação antes. “Foi uma surpresa terem me escolhido. Me sinto honrada”, disse em entrevista ao CDHIC.
Ela chegou ao Brasil em 1996 para tentar uma vida melhor. Na Bolívia, já trabalhava como empregada doméstica e aqui passou a exercer a profissão no início dos anos 2000. Por seis anos – de 2008 a 2014 – Soliz trabalhou na casa de uma brasileira, na zona leste da cidade, como trabalhadora doméstica. Fazia de tudo: cozinhava, limpava a casa, cuidava das crianças e até do cachorro. Entrava por volta das 11h e saía no fim da tarde todos os dias. Pelo seu trabalho, começou recebendo apenas R$200,00. Em 2014, o valor ainda era de apenas R$400,00. Quando questionava a patroa, esta dizia que “era isso mesmo”, “que ela ganhava bem”. E quando Soliz ficou doente e precisou ficar dois meses afastada por problemas no coração e na coluna, a patroa disse que ela não tinha nada para receber.
Mas Soliz foi orientada pelo STDMSP sobre os direitos trabalhistas que existem no Brasil e, com a ajuda do sindicato, processou a ex-patroa e ganhou a ação na Justiça do Trabalho em 2016. Agora, fazendo parte da direção do STDMSP, ela pode colaborar na orientação de outras mulheres migrantes, principalmente porque consegue ultrapassar a barreira da língua, que dificulta o acesso dos migrantes à informação. “Muitas mulheres que chegam aqui não falam português. Eu também passei pela mesma dificuldade quando cheguei”, contou Soliz. “Vou fazer o que eu puder para ajudar. Aprendi muito e vou aprender muito mais”, completou.
Foi durante a última parte do encontro, após reunião da diretoria, que a advogada do STDMSP, Zenilda Ruis Da Silva Silveira, comunicou que o sindicato passaria a ter uma representante imigrante, Diana Soliz, em sua diretoria. Silveira acrescentou que a iniciativa foi resultado de todos os debates que ocorreram nestes encontros junto às mulheres migrantes trabalhadoras domésticas.
Nova Lei de Migração permite a associação sindical de imigrantes
Em vigor desde terça-feira, 21, a nova Lei de Migração trouxe um grande avanço em relação ao Estatuto do Estrangeiro: o direito de associação e participação para fins lícitos. O art. 4º da Lei 13.445 diz expressamente que “ao migrante é garantida no território nacional, em condição de igualdade com os nacionais, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, bem como são assegurados: [...] VI - direito de reunião para fins pacíficos; VII - direito de associação, inclusive sindical, para fins lícitos”.
“Com a nova lei de imigração é permitido que os migrantes se sindicalizem e, inclusive, façam parte da direção dessas entidades”, explica Paulo Illes, coordenador do CDHIC. “A conscientização sindical e a abertura da participação política para os migrantes são lutas que o CDHIC vem empreendendo há muito tempo. Temos projetos que visam, justamente, promover esse engajamento dos migrantes na esfera política, como a parceria com o Ministério Público, sindicatos, associações de imigrantes e sociedade civil sobre conscientização sindical e também as rodas de conversas com mulheres migrantes e refugiadas trabalhadoras domésticas, em conjunto com o AFL-CIO Solidarity Center.
Illes destaca que ter uma representante migrante no STDMSP é especialmente importante, uma vez que as trabalhadoras domésticas migrantes estão mais sujeitas à exploração laboral e a situações análogas ao trabalho escravo. “É preciso evitar que mulheres imigrantes e refugiadas caíam em armadilhas e acabem trabalhando em regime de escravidão. Isso ocorreu recentemente com várias migrantes filipinas em casas de famílias de alta renda em São Paulo, como foi constatado pelo Ministério do Trabalho neste ano”, disse Illes. “Certamente uma mulher imigrante na direção do sindicato pode fortalecer o combate a essa prática”, completou.